Data

Factos

   
1926

  
Menos  de um mês depois do golpe militar de 28 de Maio, a 22 de Junho, é instituído um regime de Censura Prévia, tido como medida transitória, em resultado da suspensão das garantias constitucionais da República.

A 24 de Junho os jornais apresentam a informação lapidar: “este número foi visado pela Comissão de Censura”. Os jornais tinham de enviar quatro provas de cada página para a Comissão de Censura e não podiam deixar espaços em branco, após os cortes.

Pouco tempo depois do golpe, o general Gomes da Costa dizia que não estava disposto a estabelecer a censura à imprensa. Com esta ironia ameaçadora: “pelo menos enquanto os jornais não me incomodarem”.

  

Apesar de dois decretos surgidos em Julho ( a 5 e 29) defenderem que “a todos é lícito manifestar livremente o seu pensamento por meio da imprensa”, o regime de censura prévia militar mantém-se até ao fim da Ditadura Militar, com a Constituição de 1933.

 

O jornal “O Mundo” é suspenso.

 

Em Novembro, começam a surgir jornais clandestinos.
 

  
1927

 
A 8 de Fevereiro, o jornal “O Mundo” apresenta uma grande manchete sobre o golpe do dia anterior: “Republicanos: Às Armas!/ A Revolução em marcha/ Abaixo a Ditadura”. É novamente suspenso e começa a aparecer apenas uma vez por ano para manter o título.

(Na edição de 1928 anuncia que a publicação é feita para garantia do título. Na manchete, a toda a largura da página, lê-se: “Viva a República”. E logo a seguir: “O Mundo no cumprimento de uma obrigação que a lei impõe reaparece hoje passado um ano de silêncio, para desaparecer novamente, não se sabe por quanto tempo”).

 

“O Reviralho”, “A Revolta” e “O Tacho” são alguns dos títulos clandestinos que circulam em Portugal.

 

Um decreto de 16 de Abril sujeita a processo sumário o julgamento de certos delitos de imprensa, designadamente a produção de “noticias tendenciosas ou de propaganda subversiva”.

 

Através do Decreto-Lei nº13564, de 6 de Maio, a censura é aplicada a fitas cinematográficas.

 

A 27 de Junho, é aprovado um diploma (Decreto-Lei nº18841) que regulamenta a Liberdade de Imprensa nas colónias.

 

Durante todo o ano, o lápis de Francisco Valença enche várias primeiras páginas do semanário humorístico "Sempre Fixe", criticando mordazmente a acção da Censura.

 

   
1931

 
Inicia-se a 15 de Fevereiro a publicação do “Avante”, órgão do PCP. Trata-se de um jornal clandestino (do também clandestino Partido Comunista Português), mensal, que viria a ser o mais duradouro não só de todo o regime, mas da imprensa periódica portuguesa em geral.
 

 
1932

 
São publicadas, em Julho, as “Instruções Gerais” da Direcção Geral dos Serviços de Censura. No 1º parágrafo, em “fins”, lê-se que “a censura foi instituída pelo governo da Ditadura Militar com o fim de evitar que seja utilizada a imprensa como arma política, contra a realização do seu programa de reconstrução nacional, contra as instituições republicanas e contra o bem estar da nação”.
 

   
1933

  
A Censura Prévia é legalmente instituída através quer da Constituição, quer de um Decreto-Lei específico (n.º22469, de 11 de Abril). As Comissões de Censura passam do Ministério da Guerra para o Ministério do Interior.

A Constituição, apesar de estipular a garantia da “liberdade de expressão do pensamento sob qualquer forma”, afirma que leis especiais irão regular aquela liberdade, de forma a “impedir preventiva ou repressivamente a perversão da opinião pública na sua função de força social, e salvaguardar a integridade moral dos cidadãos.”

O Decreto-Lei atrás referido e publicado no mesmo dia do texto constitucional (11 de Abril) diz estranhamente no seu artigo 2º que “continuam sujeitas a Censura Prévia as publicações definidas na Lei de Imprensa e bem assim as folhas volantes, folhetos, cartazes e outras publicações, sempre que em qualquer delas se versem assuntos de carácter político ou social”. Este decreto é, no âmbito da imprensa, o primeiro que surge assinado por Óscar Carmona, Presidente da República, e Oliveira Salazar, Presidente do Conselho.

 

Em 29 de Junho, é criada a Direcção Geral dos Serviços de Censura, na inteira dependência do Ministério do Interior (Decreto-Lei nº22756).

A imprensa clandestina começa a surgir como forma de contar aquilo que a máquina censória corta. Um dos exemplos é o jornal “A Verdade”.

   

   
1934

   
Em Janeiro, começa a aplicar-se em Moçambique a Censura Prévia, com base no Decreto-Lei nº22469.

Os Serviços de Censura elaboram, em Janeiro, uma lista nacional com os jornais que consideram “comunistas” e “com ligações maçónicas”.
   

 
1936

 
São constituídos os Serviços de Censura, apesar da falta de publicação de tal determinação no “Diário do Governo”.

Sai o jornal clandestino “O Marinheiro Vermelho”, órgão da ORA (Organização Revolucionária da Armada) cuja importância na insurreição da Armada viria a ser grande.

Através do Decreto-Lei nº26589, a fundação de qualquer jornal fica sujeita a uma autorização prévia do governo, mediante a análise da “idoneidade moral e financeira dos responsáveis”. A Direcção dos Serviços de Censura podia recusar, por exemplo, o nome do director do jornal, de forma discricionária. Uma ou mais vezes, como aconteceu, provocando o colapso de muitos projectos jornalísticos.

A 17 de Agosto, a Censura corta integralmente a última crónica de Mário Neves para o “Diário de Lisboa”, sobre a Guerra Civil de Espanha. Enviada telefonicamente de Badajoz, ela só viria a ser divulgada em Portugal depois do 25 de Abril. “Vou partir. Quero deixar Badajoz, custe o que custar, o mais depressa possível e com a solene promessa à minha própria consciência de que não mais voltarei aqui”—começava assim a crónica-reportagem que relatava os horrores da chacina provocada pela entrada das tropas do general Franco em Badajoz.

   
1937

 
A 27 de Janeiro, é publicado o Decreto-Lei nº27495 que reúne a legislação dispersa promulgada para as Colónias sobre o exercício da Liberdade de Imprensa. Um dos capítulos, o VII, é totalmente dedicado à Censura.
  

    
1939

 
A Lei nº1974, de 16 de Fevereiro, determina que “os Serviços de Censura e Inspecção dos Espectáculos serão reorganizados por forma a assegurar a sua unidade”.
    

   
1943

  
O Decreto-Lei nº33015, de 30 de Agosto, clarifica que a sujeição aos Serviços de Censura é obrigatória também para as editoras de livros e de quaisquer outras publicações. Segundo o articulado da lei, os “transgressores” poderão ser penalizados com uma multa até 200.000$00, suspensão até 180 dias, ou mesmo supressão e encerramento temporário ou definitivo da empresa.

O mesmo decreto alarga as exigências documentais para a aceitação dos responsáveis pelas publicações.
  

  
1944

 
O Decreto-Lei nº33545, de 23 de Fevereiro, faz com que saiam da alçada do Ministério do Interior os Serviços de Censura, os quais passam, na prática, para a dependência directa de Salazar.

Através do Decreto-Lei nº34133, de 24 de Novembro, o Secretariado Nacional de Informação e Cultura Popular incorpora os Serviços de Censura e os Serviços de Inspecção aos Espectáculos.
   

  
1945

  
O Decreto-Lei nº34560, de 11 de Maio, institui formalmente uma Comissão de Censura para teatro e cinema.
   

 
1946

 
Em Janeiro, Salazar, o verdadeiro controlador máximo e directo da Censura, repreende por escrito os serviços centrais da Censura por terem sido brandos com o semanário “Agora” que, além de uma suspensão, ficou sujeito a provas de página. Salazar queria maior dureza: “mais valia ter alargado a suspensão”, escreveu ele.

 

Em Fevereiro, é entregue ao Presidente da República, Marechal Óscar Carmona, um abaixo-assinado com mais de 230 assinaturas, pedindo que “seja imediatamente publicada e posta em vigor a Lei de Imprensa prometida pelo Governo, com as garantias indispensáveis à livre, responsável e digna expressão do pensamento, eliminando definitivamente o regime de censura a que estamos ainda submetidos”.

Os subscritores são jornalistas e colaboradores permanentes da imprensa. Alguns nomes: Aquilino Ribeiro, José Régio, Mário Dionísio, Rodrigues Lapa, Adolfo Casais Monteiro, José Gomes Ferreira, Joaquim Manso (director do “Diário de Lisboa”), Artur Portela, Álvaro Salema, Raúl Rego, Fernando Lopes Graça e Maria Lamas.

 

Em Julho, os Serviços de Censura proíbem a circulação em Portugal da revista “Time” do dia 22, por dela constar um longo artigo pouco abonatório para o regime de Salazar. O tema é mesmo capa da revista, sendo Salazar apresentado como o decano dos ditadores. Um grande retrato de Salazar, junto não do brasão português, mas de uma maçã em decomposição, enche a capa da revista.

   

Em Novembro, o escritor Ferreira de Castro considera, numa mensagem que envia ao Movimento de Unidade Democrática, que a Censura é “uma arma de dois gumes”. Explica: “ela pode cobrir todos os erros dos que a estabelecem e mandam; ela pode iludir a opinião pública e criar falsos ídolos; ela pode sustentar no poder, durante dezenas de anos, homens ou ideias que, só por eles, talvez os países não sustentassem dezenas de dias; mas, quase sempre, a Censura acaba por ser fatal também aos próprios que a instituem”.
 

 
1947

  
Numa carta endereçada em Dezembro ao jornal “O Primeiro de Janeiro”, o General Norton de Matos refere-se à retenção de artigos seus pela Censura.

Cometendo o crime habitual de violação da correspondência, a PIDE fez uma cópia da carta.

 

Surgem os jornais clandestinos “Barricada” e “Democracia”.

 

Em Agosto, o “Diário Popular” é multado em 200$00, por ter publicado uma notícia sobre a “rainha de Itália” em termos que a Censura considerou desrespeitosos. Vejamos toda a notícia:

Título: “A mulher de Humberto de Itália foi autorizada a viver na Suíça”. Texto: “Berna, 22 – O Ministério dos Negócios Estrangeiros anunciou que concedeu autorização a Maria José, da Itália, esposa do ex-rei Humberto, e a dois filhos para residirem na Suíça. Acrescenta que Humberto da Itália não pediu autorização para viver na Suíça, mas se fizesse tal pedido, seria rejeitado.”
  

 
1948

  
Em Dezembro, é proclamada pela ONU a Declaração Universal dos Direitos do Homem, composta por 30 artigos.

O seu 19º artigo diz claramente que “todo o indivíduo tem direito à liberdade de opinião e de expressão, o que implica o direito de não ser inquietado pelas suas opiniões e o de procurar receber e difundir, sem consideração de fronteiras, informações e ideias por qualquer meio de expressão”.
 

 
1949

 
Norton de Matos, candidato da oposição à Presidência da República, escreve, em Janeiro, a Salazar, reclamando a publicação de comunicados da sua candidatura.

 

Em Janeiro, a Comissão de Censura proíbe que no catálogo da Terceira Exposição Geral do Grupo Surrealista de Lisboa figure o seguinte texto: “O Grupo Surrealista de Lisboa/pergunta/depois de vinte anos de Medo/ainda seremos capazes de/Liberdade?/É absolutamente/ indispensável/votar contra/ o Fascismo”. Decorria a campanha de Norton de Matos e António Pedro, líder do Movimento Surrealista, pertencia à comissão de candidatura à Presidência da República.

 

Em Fevereiro, em carta pública “À Nação”, o General Norton de Matos volta a exigir a abolição da Censura.

 

Um Decreto-Lei de 13 de Junho regula a apreensão de “publicações, imagens ou impressos pornográficos, subversivos ou simplesmente clandestinos” e o encerramento das tipografias que “imprimirem publicações, manifestos, panfletos ou outros escritos subversivos ou que possam perturbar a ordem pública sendo apreendidos e revertendo para o Estado as respectivas máquinas e restantes bens móveis”.
 

   
1950

   
A 4 de Novembro foi assinada a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, a qual só entrará em vigor a 3 de Setembro de 1953. Portugal não consta da lista dos países subscritores desta Convenção.
 

 
1956

 
Em Julho, um grupo de 50 intelectuais solicita “a revogação consequente do regime de Censura”, num abaixo-assinado dirigido ao Presidente da República. Subscrevem-no, entre outros: António Sérgio, Aquilino Ribeiro, Ramada Curto, António Luís Gomes e Câmara Reis.
    

 
1958

 

 

 

 
Apesar do abrandamento da Censura em Maio, durante a campanha eleitoral para a Presidência da República, na qual se integra a candidatura carismática do General Humberto Delgado, muitos são os cortes nas notícias sobre a campanha do “General Sem Medo”.

 

Em Julho, dá entrada na Presidência da República uma petição para que “fosse abolida a Censura em Portugal, pois só assim a imprensa cumpriria a sua missão de utilidade pública, reconhecida pela própria Constituição da República Portuguesa”.

É subscrita por dezenas de jornalistas profissionais do Porto.
 

  
1961

 
Novo e longo abaixo-assinado, de âmbito nacional, é dirigido ao “Presidente da República”, pedindo a abolição da Censura.
 

   
1962

   
Em Abril, através do Decreto-Lei nº44278, os “crimes de imprensa” passam a ser julgados nos tribunais plenários.

 

Num Despacho de 20 de Outubro, Salazar declara que “os Serviços de Censura dependem exclusivamente da Presidência do Conselho e não recebem ordens de qualquer outro departamento de Estado.”

Os Serviços de Censura tanto cortam textos políticos, como simples convocatórias para assembleias gerais, em cine-clubes ou sindicatos.
   

     
1965

 

   
Em Abril, o director do “Diário de Lisboa”, Norberto Lopes, escreve um artigo alusivo aos 43 anos do jornal – “A favor e contra” – e envia-o à Censura, quatro dias antes da data prevista para a sua publicação. Passa sem cortes. No dia seguinte, é alertado: “Há cortes!”. Esta incoerência leva-o a recorrer para Salazar. E no dia seguinte recebe a resposta redigida pelo próprio punho do ditador: ”(...) Mandei dizer aos serviços que não via razão para não manter a primeira decisão e que era essa atitude que deviam tomar. Para evitar mal-entendidos parece-me, porém, que no 2º granel, linha 12, devia ser eliminada a palavra pretendida e mais adiante, linha 35, a palavra orquestradas”.

 

A Sociedade Portuguesa de Escritores é assaltada pela PIDE, na noite de 21 de Maio, na sequência da atribuição do Grande Prémio de Novela ao autor de “Luanda”, o escritor angolano Luandino Vieira, que se encontrava preso no Tarrafal por motivos políticos.

 

Uma informação saída em Setembro, no “Diário de Notícias”, 1ª página, sobre a ida do Benfica a Moscovo, vai provocar a audição em auto, na PIDE, do director de uma empresa turística que está na origem da notícia.

 

Suspensão do “Jornal do Fundão”.
    

 
1966

 


Na sequência do concílio “Vaticano II”, o papa Paulo VI suprime o Index, terminando assim, formalmente, uma história longa de 42 livros de “proibição de títulos”, iniciada em 1557 no mundo católico, com o “Index Librorum Prohibitorum” do Papa Paulo III.  
    

 
1968

 
Com a entrada de Marcelo Caetano no Governo, em Setembro, atenua-se a malha censória.

Em todo o país funcionam 18 delegações dos Serviços de Censura sedeados em Lisboa.
 

   
1969

 
A Censura corta, a 6 de Setembro, um
telex da “France Presse” sobre a entrevista dada por Salazar ao “L’Aurore”, na qual ele fala como se ainda fosse Presidente do Conselho de Ministros, cargo que havia deixado em Setembro de 1968 e que era, desde essa altura, ocupado por Marcelo Caetano. Segundo o jornalista Roland Faure que entrevistou Salazar , “os que o rodeiam velam para que seja mantida a ilusão, ou melhor: uma verdadeira cumplicidade feita de respeito, de gratidão, de fidelidade estabeleceu-se entre as mais altas figuras do Estado”. Para Salazar, Marcelo Caetano continua a ensinar Direito na Universidade e “não faz parte do Governo”.

 

Em Julho, a Comissão Executiva da Comissão Eleitoral de Braga emite um comunicado em que defende a Liberdade de Imprensa.

Notícias sobre o II Congresso Republicano de Aveiro são alvo de cortes.
  

  
1969-70

  
Várias provas tipográficas do “Primeiro de Janeiro”, “Jornal de Notícias”, “República” e “Diário de Lisboa” atestam a forma ora ridícula, ora violenta, como a Censura coarctava a difusão de ideias.
   

  
1970

  
Em Fevereiro, surge em Braga uma declaração sobre a apreensão pela PIDE de livros nas livrarias e casas editoras.
  
Em Braga e noutras cidades surge um manifesto clandestino – “Movimento da Oposição Democrática: Nova Vaga de Repressão” – com notícias de repressões feitas pela polícia política, a PIDE.
  
A 22 de Abril, os deputados da ala liberal Sá Carneiro e Pinto Balsemão apresentam, na Assembleia Nacional, um projecto de Lei de Imprensa que reduz significativamente o âmbito de actuação da Censura e que recebe a anuência do Sindicato Nacional dos Jornalistas.
  
O boletim da paróquia de Macieira da Lixa – “Encontro”, nº5 – editado em Junho, é apreendido pela polícia.
  
Circulam jornais clandestinos como “O Bolchevista”, o “Avante”, e “Portugal Democrático”.
  
Em Dezembro, o Governo envia para a Assembleia Nacional uma proposta de Lei de Imprensa.
   

   
1971

  
Em Maio, a Comissão de Defesa da Liberdade de Expressão emite um documento apelando ao direito do exercício da liberdade.

Também em Maio, é enviada uma carta ao presidente da Assembleia Nacional sobre a defesa da Liberdade de Imprensa. Subscrevem-na muitos democratas.

Inicia-se a 27 de Julho, na Assembleia Nacional, a discussão da Lei de Imprensa, proposta por Marcelo Caetano, em Dezembro do ano anterior.

Jornais clandestinos como o “Avante”, a “Luta Anti-Colonial” e a “Frente” circulam no país.

Em Novembro, é censurada uma carta do escritor Ferreira de Castro dirigida ao “Diário de Notícias” sobre os motivos da recusa de concessão de uma entrevista à RTP.
 
A 20 de Dezembro é publicada no Diário do Governo a Lei nº5/71, de 5 de Novembro, em cujas resoluções a Assembleia Nacional determina que a imprensa periódica fica sujeita ao Exame Prévio, se ocorrerem “actos subversivos graves em qualquer parte do território nacional”. Como a mesma assembleia havia declarado que se verificavam “actos subversivos graves”, o “exame” continuou como anteriormente. Em resumo, a mudança mais significativa a registar é a do nome da instância censória: a Comissão de Censura passa a chamar-se Comissão de Exame Prévio.
 
A expectativa de abrandamento da Censura prometida pela “Primavera Marcelista” gorou-se em pouco tempo. Como disse Norberto Lopes, antigo director do “Diário de Lisboa” e de “A Capital”, a Censura “passou a exercer-se por forma ainda mais severa e atrabiliária do que no consulado de Salazar.”
   

   
1972

  
Textos de José Saramago
destinados ao “Jornal do Fundão” são censurados, a par de muitos outros em diversos jornais.

A 5 de Maio, o governo de Marcelo Caetano publica o Decreto-Lei nº150/72, sobre o estatuto da imprensa, fundado na Lei 5/71 da Assembleia Nacional.

Surge uma nova tipologia de decisões censórias com “visto” e “autorizado”, “autorizado com cortes”, “suspenso”, “demorado” e “proibido”.

A lei proíbe, todavia, qualquer referência ao facto de as publicações serem sujeitas ao Exame Prévio. Ou seja, a Censura continua, mas os jornais ficam proibidos de escrever “Visado pela Censura”, como até então se fazia.

A 31 de Maio sai pela última vez na imprensa portuguesa a indicação “Visado pela Censura” na primeira página, por imposição da nova Lei de Imprensa que entra em vigor no dia 1 de Junho.

Com base na legislação recentemente publicada, são dimanadas, a 1 de Junho, pelo governo de Marcelo Caetano, as “Instruções sobre o Exame Prévio” das quais constam todas as regras do aparelho censório. Delas constam: a definição dos limites à Liberdade de Imprensa; publicações sujeitas a Exame Prévio; a constituição das Comissões de Exame Prévio; a execução do Exame Prévio; e a especificação dos recursos e infracções. Estas normas deixam um vasto espaço para a descricionaridade dos censores.

No dia 1 de Junho, os jornais “República” e “Diário de Lisboa” aludem, na 1ª página, ao “Exame Prévio”. O “República” titula a nota sobre o assunto com “Estatuto da

Imprensa”, e o “Diário de Lisboa” com “O Exame Prévio”. Ambas as notas transcrevem excertos do Decreto-Lei nº150/72: “quando estiver em vigor o regime do Exame Prévio, os escritos ou imagens só poderão ser publicados depois de autorização dada através de um visto”; “os textos ou imagens submetidos a Exame Prévio poderão ser proibidos total ou parcialmente, mas nunca alterados, embora nos textos ou imagens publicados não seja consentida qualquer referência ou indicação de que foram submetidos a Exame Prévio”.

No dia 2 de Junho, o “República” foi o único jornal a trazer uma referência à Censura Prévia: “este jornal foi submetido a Exame Prévio”, no canto inferior esquerdo da 1ª página.
 
De 3 a 9 de Junho, o “República” refere-se à Censura, aludindo à legislação que a institui. Numa pequena caixa da 1ª página, transcreve o “Artigo 101-2º do Decreto-Lei nº150/72: nos textos ou imagens publicados não é consentida qualquer referência ou indicação de que foram submetidos a Exame Prévio - Diário do Governo, 5 de Maio de 1972.” Do dia 10 de Junho em diante, não foi mais tolerada qualquer referência à existência daquele Exame Prévio.
     

   
1973

   
Surgem em várias cidades documentos clandestinos e semi-clandestinos de apelo à luta pelas liberdades. O jornal “O Grito do Povo”, órgão da OCMLP (Organização Marxista-Leninista de Portugal), é lançado no Porto.

O III Congresso Democrático de Aveiro é fortemente censurado em grande parte das publicações.

Em Novembro, é totalmente proibida, no jornal “O Comércio do Porto”, a publicação de uma página especial dedicada aos direitos humanos e alusiva aos 25 anos da Declaração Universal. A página incluía todos os direitos e algumas fotos ilustrativas de situações desumanas.
    

   
1974

 

 

  
Sai em Abril o último “Avante” clandestino. É o nº464, série VI, com dois títulos fortes: “Não dar tréguas ao Fascismo” e “Aliar à luta antifascista/ os patriotas das Forças Armadas”.

Na noite de 24 para 25 de Abril, os “Coronéis da Censura” não abrandam o seu trabalho de corte. Várias notícias sobre o movimento dos Capitães de Abril são censuradas, mesmo de madrugada. Exemplos: “O Ministro do Exército em contacto com oficiais do Movimento”; “Preso o comandante da Região do Porto”; “Aqui Comandos”; “Disposições frente à casa do General Spínola”; “Tiros disparados na Baixa Lisboeta”.

O Programa do “Movimento dos Capitães” é claro nas medidas imediatas a tomar: “Abolição da Censura e Exame Prévio”. Trata-se da medida “G”, na qual é anunciada a criação de uma “Comissão Ad-Hoc”, de carácter transitório e directamente dependente da Junta de Salvação Nacional. Justificação: “salvaguardar o segredo dos aspectos militares e evitar perturbações na opinião pública, causadas por agressões ideológicas dos meios mais reaccionários”. A 2 de Maio foi nomeada a Comissão, integrada apenas por militares.

A acção desta Comissão foi contestada e pouco tempo depois, com a Lei de Imprensa de Fevereiro de 1975 (Decreto-Lei nº85-C/75), deixou de fazer sentido. Estava instituída a Liberdade de Imprensa que viria a ser consagrada na Constituição entrada em vigor a 25 de Abril de 1976.

Infundados pelo espírito do “25 de Abril”, os artigos 37º e 38º da Constituição inscrevem “a Liberdade de Expressão e Informação” e “a Liberdade de Imprensa” nos direitos fundamentais da cidadania portuguesa. O artigo 37º diz claramente que “todos têm direito de exprimir e divulgar livremente o seu pensamento pela palavra, pela imagem ou por qualquer outro meio, bem como o direito de se informar, sem impedimentos nem discriminações”. Acrescenta que “o exercício destes direitos não pode ser impedido ou limitado por qualquer tipo ou forma de censura”.

O Artigo 38º, especificamente sobre a Liberdade de Imprensa, contem sete parágrafos:

“1. É garantida a Liberdade de Imprensa.

2. A Liberdade de Imprensa implica a liberdade de expressão e criação dos jornalistas e colaboradores literários, bem como a intervenção dos primeiros na orientação ideológica dos órgãos de informação não pertencentes ao Estado ou a partidos políticos, sem que nenhum outro sector ou grupo de trabalhadores possa censurar ou impedir a sua livre criatividade.

3. A Liberdade de Imprensa implica o direito de fundação de jornais e de quaisquer outras publicações, independentemente de qualquer autorização administrativa, caução ou habilitação prévias.

4. As publicações periódicas e não periódicas podem ser propriedade de quaisquer pessoas colectivas sem fins lucrativos e de empresas jornalísticas e editoriais sob forma societária ou de pessoas singulares de nacionalidade portuguesa.

5. Nenhum regime administrativo, ou fiscal, nem política de crédito ou comércio externo, pode afectar directamente ou indirectamente a Liberdade de Imprensa devendo a Lei assegurar os meios necessários à salvaguarda da independência de imprensa perante os poderes político e económico.

6. A televisão não pode ser objecto de propriedade privada.

7. A Lei estabelece o regime dos meios de comunicação social, designadamente dos pertencentes ao Estado, mediante um estatuto da informação.”

O vespertino “A República”, dirigido por Raúl Rego, publica em rodapé, a toda a largura da 1ª página do dia 25 de Abril, uma informação de arromba: “Este jornal não foi visado por qualquer Comissão de Censura”. O rodapé manter-se-á nas edições do dia 26 de Abril.”